sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Da apropriação dos discursos

Há algum tempo venho matutando sobre um fenômeno no mínimo intrigante, a apropriação de discursos. Todos os dias, uns mais outros menos, sou obrigado a escutar abobrinhas variadas de várias pessoas, em todos os lugares. No ônibus, no trabalho, na fila do supermercado, na conversa com amigos de amigos e por aí vai. Opiniões são tratadas como a mais pura verdade e eventuais discordâncias nunca são levadas em consideração. Exemplos não faltam. Desde o caso da menina da Uniban até enchentes, jogos de futebol, trânsito, corrupção, política, direitos humanos, pedagogia, tudo parece despertar nas pessoas uma certeza inabalável, calcada em motivos e provas irrefutáveis. Acontece que, chato que sou, tenho a mania de discordar da maioria das coisas que ouço, ás vezes realmente por não concordar, outras apenas por prazer. Quando os porquês são feitos, a imensa maioria das pessoas não consegue sustentar um único argumento plausível que sustente suas ideias ou opiniões. Se utilizam das mais variadas formas de falácias, fogem do assunto, apelam à moral e aos bons costumes etc. Sobre as mil e uma maneiras de como identificar conclusões equivocadas, visite este sítio.

É interessante saber os mecanismos utilizados para abalizar, mesmo que de maneira precária, preconceitos e visões de mundo estreitas. Mas o mais fascinante - e aterrador, como quase tudo que é fascinante - é tentar dialogar com as pessoas. É incrivelmente difícil. Lembro de estar discutindo o caso Geisy (mini-saia, Uniban, etc) com algumas pessoas e, após algumas considerações, ter ouvido que ela "mereceu pois estava agindo como puta" e "não se deu ao respeito" ou ainda "queria o que, ali não era lugar de usar mini-saia". Nem preciso rebater esses pseudo-argumentos, como tentei em vão na ocasião. O assustador é que, claramente, aquele discurso ultramoralista não combinava com o estilo ou com a prática das pessoas. As próprias garotas que criticavam o vestido de Geisy usavam decotes muito mais ousados, por exemplo. E "ficavam" com vários meninos, conversavam abertamente sobre sexo, ou seja, uma coisa não batia com a outra. Só pode ser um discurso apropriado, nulo de reflexões.

A característica básica dos discursos apropriados é a certeza quase arrogante daquilo que se fala, aliada a uma certa truculência verbal. Tiozinhos empresários que nunca visitaram uma favela falando que as pessoas que foram parar lá foram pq quiseram, então merecem viver na miséria - e ai de quem discorde - são outro bom exemplo. Aliás, essa alienação toda em torno da pobreza é foda. Já vi gente muito pobre defendendo com unhas e dentes o direito de fulano andar com carrão importado, enquanto se espremiam todos os dias em ônibus e trens lotados. Sei que a mídia é a principal propagadora dos discursos apropriados, e esse vídeo fala bem disso. Entretanto, quem recebe as mensagens deveria, em tese, poder analisar os discursos e formar sua própria opinião a respeito. Não parece que isso esteja acontecendo.

Começo a acreditar que para a maioria das pessoas o discurso de formatura entrou por um ouvido e saiu pelo outro. Quem não se lembra d@ paraninf@ da turma, emocionad@, dizendo que, a partir daquele instante, deveríamos continuar aprendendo continuamente, dessa vez na "escola da vida", ou que nunca deveríamos parar de estudar? Pois é, a impressão geral que tenho disso tudo é que as pessoas se sentem muitíssimo satisfeitas com as explicações que já tem para a sua vida e para o mundo, e toda tentativa de entender as coisas de outra maneira pode significar uma mudança terrível, rumo ao desconhecido. Todo mundo parece querer mudar apenas de condição sócio-econômica, levando para o túmulo, além do carrão importado - ou par de tênis, dependendo do caso - seus preconceitos, conceitos e defeitos. Espero não morrer assim.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Exterminador do Futuro


É uma piada fácil, mas é boa... Olha quem se encontrou em Copenhagen: O exterminador do futuro da ficção - Schwarzenegger, é claro - e o exterminador do futuro caso se eleja presidente do Brasil.

A pergunta que fica é o que diabos o Serra foi fazer na Dinamarca. Ele não faz parte da comitiva brasileira e não entende patavinas de meio-ambiente. Obviamente, foi até o país nórdico para aparecer, nos veículos de sempre - Folha, Veja e outros lixos...

Não considero ético falar em enchentes e tal, como a mídia sempre fez com os governos do PT, mas é muito oportunismo desse Serra sair de São Paulo com todos esses problemas acontecendo aqui e em Brasília, com o seu ex-candidato a vice-presidente, o Arruda Panetone. O aquecimento global, pelo menos pro Serra, veio bem a calhar...

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Dinheiro, muito dinheiro...

Ler é um verbo que engana, como quase todos os outros verbos transitivos. Não se sabe, nesse caso, o que leram. Por isso, deveriam ser criados novos verbos, intransitivos, que expressassem de uma só vez todo o sentido da leitura. Não darei exemplos , até porque nem de perto tenho a presteza do João Guimarães Rosa. Com a criação desses verbos, evitaríamos prolongar conversas inúteis e situações constrangedoras. Eu não perderia dez valiosos minutos da minha vida ouvindo as desventuras de um casal-que-comprou-um-cão-e-não-sabia-como-criá-lo-mas-aos-poucos-se-apaixonou e blá blá blá. Ao ouvir o novo verbo criado para esse tipo de leitura, nem me daria ao trabalho de perguntar o assunto. Simples assim.

Mas esse post não é sobre verbos, como o título indica, embora, de alguma maneira, o verbo ler o tenha desencadeado. O post é sobre dinheiro. Muito dinheiro. E sobre pessoas babacas. Porque um não vive sem o outro. Podem chamar de inveja, dor-de-cotovelo ou coisa que o valha. Eu não me importo. Prefiro ser pobre do que gostar do que os ricaços gostam. Há quem defenda que são apenas os novos ricos, que os quatrocentões não são bregas e tal, mas eu extendo o racicínio a todos os afortunados. Também há babacas entre os pobres. Na realidade, há babacas em todos os lugares, em maior número do que as pessoas legais. Eu mesmo devo ser um babaca. Mas não no sentido desse post.

Pois bem. Peguei uma revista, cujo nome prefiro omitir, mas que lembra muito a terceira pessoa do singular no gênero masculino, para dar uma olhada no banheiro. Leitura de privada pode ser qualquer coisa, menos densa. Não há tempo hábil para reflexão. Revistas são a companhia perfeita. Mas este post não é sobre banheiro ou leitura de banheiro. É sobre dinheiro. Muito dinheiro. Folheando as páginas, me deparei com uma seção intitulada "Deluxe". Honestamente, não sei se é parte de todas as edições ou foi uma seção criada exclusivamente para a edição natalina. Não importa. A chamada da seção era uma frase em inglês - o cúmulo da breguice nacional - "Make a wish. Aproveite o fim do ano e eleve a dose de glamour do seu natal". Nas páginas a seguir, fotos com presentes "deluxe". Começava com presentes modestos. Perfumes na faixa dos R$300,00. É menos do que um salário mínimo. A seguir, relógios que iam de R$21 mil a extratosféricos 196 mil reais. Puta que o pariu! Quase 200 mil reais num relógio! A monstruosidade continuava, com celulares de R$7,5 mil, sapatos de 10 paus(!) e lenços valendo milão.

Inconformado, procurei outra página. Achei outra seção, "Fashion Estilo". Lá estava uma retardada falando sobre as coisas que tem. Produtos subfaturados da Daslu, bolsas, sapatos, maquiagem. Decido pular algumas páginas para não vomitar. Entrevista com uma estilista. Gosta de férias em Saint-Tropez, bolsas Dolce e Gabbana e festas que fecham a rua. Próximo!!! "O que vestem as party girls?", pergunta a infame revista. "No verão de Ibiza, microvestidos verde-elétrico e turquesa", responde, sem medo. E tinha muito mais. Decidi não encostar mais naquela revista.

É um mistério insolúvel, ao menos para meus pobres neurônios, o público dessa revista. Quem lê esse lixo? Indaguei à dona da revista, que me respondeu docemente: ninguém lê, é só para ver as tendências da moda.

Eu não concordo (como de costume). Pessoas legais a utilizam dessa maneira, na melhor das hipóteses. Babacas ricaços vão atrás dos endereços das lojas para comprar as peças sugeridas. Essas publicações ainda contribuem para legitimar essa porcaria de indústria do luxo, uma excrecência por si só. Eu leio no banheiro, ou melhor, lia. Fiquei pensando nesse assunto, no porque dessa indústria do luxo existir...

Navegando por aí achei isso. Perto desse troço, a revista anterior parece feita para mendigos da Sé. Trata-se de uma revista que conta a história de produtos de luxo, e foi lançada para aproveitar o crescimento do mercado brasileiro nesse setor. A diferença é que o público alvo é o "segmento masculino de alta renda". Falam sobre iates, carrões, relógios ultra caros, bebidas, etc... A revista teria por nobre objetivo trazer um sentimento de exclusividade ao leitor. Visitando a página do tal Robb Report - que por sinal não poderia ter nome melhor- tem-se uma noção da parada. Aviões exclusivos, Rembrandts e o escambáu. É pra quem é rico MESMO. Tal filhadaputice só é possível nesse mundão maluco em que vivemos. Bilhões de pobres. Alguns ricaços andando de iate, avião, helicóptero. A "revista" Veja também já fez "matérias" sobre pessoas que se locomoviam em São Paulo de helicóptero, por conta do trânsito. Absurdo total.

Diante de todos esses fatos, só resta a barbárie ampla, geral e irrestrita. Porque ter um helicóptero é um ato de barbárie. É desprezar milhóes de vidas. É uma violência sem tamanho. Assim sendo, todo e qualquer assassinato, sequestro, extorsão, chantagem e o diabo cometidos contra pessoas ricaças detentoras de helicópteros, iates, mansões, Rembrandts e relógios de R$200.000 deveriam deixar de ser crime. Passariam a ser uma forma de obter o tal "sentimento de exclusividade" que os ricaços tem ao comprar seus mimos. Já pensou o Datena gritando? "Código de Hamurábi neles! Comprou um helicóptero? Sequestro-relâmpago!!! Iate novinho? Latrocínio! Põe na tela o caso do rapaz que sequestrou o dono do mercado!"

Depois ainda reclamam da violência. Quem vive num país como o nosso não pode ter helicópteros, iates e carrões se quiser viver em paz. Eles sabem disso, e blindam seus carros, suas casas, contratam seguranças, compram a polícia, a justiça e o que mais estiver a venda. Viajam para praias exclusivas, moram em condomínios fechados e fazem shoppings exclusivos. Promovem a barbárie a toda hora, todos os dias. E são vítimas dessa mesma barbárie.

Começo a achar que o Sussa tem razão. Demoramos centenas de anos aprimorando nossa tecnologia para chegarmos onde estamos. Esse é o máximo de desenvolvimento que alcançaremos. E, ao atingirmos o ápice, as "nossas" elites gastam seu tempo/dinheiro em iates e relógios de 200 paus. Os desprovidos não aceitarão isso por muito mais tempo. Em breve, reivindicarão um pouco disso tudo que esta aí, mas não está. Como não há iate pra todo mundo, não haverá pra ninguém. Todas as formas de governo atuais, todas as agências de publicidade, toda a imprensa, todos os juizados , tudo aquilo que até hoje garante e protege os abastados não serão capazes de nada. Dinheiro, muito dinheiro. É o que todo mundo quer. É o que todo mundo aprendeu a querer, lendo essas revistas, ou a Caras, ou a bosta da novela das oito. Agora aguenta.

A bárbarie vem e não há mais volta.

sábado, 5 de dezembro de 2009

Ficção??

Uma notícia no portal do Uol chama a atenção essa manhã: Ator e dramaturgo são baleados no espaço Parlapatões O curioso, se é que uma tentativa de assassinato pode ser assim adjetivada, é que o dramaturgo, Mário Bortolotto, tem um blog (e um livro derivado do blog) chamado Atire no dramaturgo. O que nos leva a pelo menos duas possibilidades.

1 - Realmente a vida imita a arte.

2 - O assaltante era um ator frustrado, recusado para integrar o elenco de Brutal ou ainda de Nossa Vida Não Vale um Chevrolet, que resolveu fazer da ficção - o livro Atire no Dramaturgo - realidade.

Não acredito em nenhuma delas e provavelmente quem fez isso é burro demais para ser ator.

Mas, se fosse, podia ser assim:

Alaor, jovem ator recém-formado pela Faculdade de Artes Cênicas da Uniban, após ser reprovado pela quadragésima vez em audições, resolve mudar de ramo. Que se fodam todos aqueles que não acreditaram no seu potencial como ator dramático! Danem-se os que o reprovaram para animar festinhas infantis! Vão à merda os donos de shopping que não o quiseram como papai noel, apesar de seu hohoho e de sua curiosa imitação de rena.

Após convencer-se de que assaltar seria mais fácil do que representar, Alaor passa longas madrugadas imaginando qual seria sua porta de entrada para o mundo do crime. Pensou em casas lotéricas, shopping centers, bancos, supermercados, farmácias, ônibus. Achou tudo muito difícil. Muitos seguranças, muitas câmeras. Menos nos ônibus. Mas ônibus é lugar de pobre, conformou-se. Já pensava em aceitar aquele emprego de porteiro de sauna da Augusta quando lembrou das bilheterias de teatro. Não que desse muito dinheiro, pelo contrário. Seria mais lucrativo assaltar o busão Terminal Capelinha, caso conseguisse sair de lá vivo. Mas seria um golpe de mestre, a vingança perfeita.

Plano pronto, sexta-feira, dirigiu-se para a Roosevelt. Esperaria o final dos espetáculos, pegaria todos desprevenidos. Caso algo desse errado, diria que tudo não passava de uma encenação, teatro de vanguarda ou coisa que o valha. Viu o ator que tinha tomado seu lugar e o autor que o tinha reprovado, não pensou duas vezes. Anunciou o assalto. Pediu toda a grana do espetáculo, nervoso, hesitante, mas com a arma em punho. Ouviu o que não queria, que não tinha grana nenhuma, sai fora! Sapecou três tiros na perna do ator, que é pra deixar de ser besta e dar chance aos que estão chegando, e depois mirou no peito do dramaturgo, que afinal de contas pedira, por escrito, para ser alvejado. Saiu correndo em disparada pela Consolação até alcançar a Xavier de Toledo, onde parou. Ficou contemplando aquele prédio antigo, imponente e assustador que se materializara em sua frente. Sim, essa havia sido sua melhor atuação, e o ato final seria em frente ao Municipal. Jogou a arma no colo do Carlos Gomes e correu.




P.S. Bortolotto e Henrique Figueroa foram internados e passam bem, na medida do possível. É muito estranho que 4 pessoas resolvam assaltar um teatro as 5:30 da manhã e que atirem 3 vezes em cada pessoa. A polícia, pra variar, não tem pistas dos assaltantes...


quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

Pontos de Observação

O automobilis taximetrum, mais conhecido no Brasil como Táxi, pertence ao reino Machinnaria, na família veiculidae. Encontrado tanto em grandes centros urbanos quanto em pequenas cidades do interior, desde sempre esteve a serviço dos seres humanos, como condução para trabalhadores, pais com flhos pequenos e bêbados em geral.

De algum tempo para cá, alguns exemplares da espécie se desgarraram de seus donos humanos e sumiram nas selvas de pedras de São Paulo. Pesquisadores americanos e italianos estão há muito tempo tentando capturar um exemplar do que tem sido chamado pela mídia global de "táxi silvestre", mas sem sucesso.

Recentemente, alguns exemplares de "táxi silvestre" foram avistados por moradores na região do Alto da Lapa, em São Paulo, mas nenhuma imagem foi feita para comprovar o feito. Pede-se cautela aos transeuntes e usuários de táxi em geral, já que os táxi silvestres são muito arredios e não toleram bem investidas de humanos, principalmente os que estiverem se deslocando a pé.

Um aviso foi colocado próximo a um famoso supermercado/academia da região, para alertar a população do risco. Buscas estão sendo efetuadas e espera-se que em breve os "táxi silvestres" sejam capturados e encaminhados para pesquisa. Quem necessitar passar pela região deve redobrar os cuidados e estar sempre alerta.